quarta-feira, 20 de março de 2019

Blade Runner - Uma Obra-Prima Cinematográfica





          Ainda me lembro da primeira vez que pus os olhos em Blade Runner. Era uma noite de segunda-feira provavelmente e ele passava na Globo. Eu era bem criança e não pude ver até o final, tinha que dormir cedo. Mas lembro de ter ficado muito curioso em ver o resto do filme. Aquela abertura de uma "cidade industria" era inquietante, instigante. Lembro do meu pai comentar algo sobre o futuro sinistro que ela antecipava. E, durante anos, eu fiquei sem ver o filme já que só chegava atrasado no canal em que estava passando e detesto ver filme pela metade. Ver filme já "começado" é que nem spoil para mim.



          Estraga tudo.



          Só fui ver completo nos meados dos anos 2000 quando a "versão do diretor" passou a se tornar a versão oficial e para tudo que é lado na internet você encontrava ela, mas nunca a versão original. De modo que, foi essa que eu vi. Gostei muito, mas...





          Como disse um professor de desenho e cinéfilo fã do filme: "Esquece a versão do diretor. Esquece... Isso não é Blade Runner. Isso é muito ruim."


(E é mesmo)


          Meses depois, aguçado pela curiosidade que o professor me deixou, já que ao debater sobre qual era a melhor versão, usei os argumentos que a gente ouve por ai hoje em dia: "Não fez sucesso", "Foi um fracasso", "O final era muito tolo e incoerente", etc...; Mas ele foi definitivo comigo: "Tá tudo errado. Todo mundo gostou do filme. Eu estava lá, você não."





           Cocei minha cabeça e segui em busca da verdade (ou da minha verdade). Precisa ver o original e tirar minhas próprias conclusões. Meses depois comprei um box com todas as versões além de um DVD de extras sobre a produção do filme (nunca ouvi falar de um making off de um filme tão detalhado). O filme possui nada mais nada menos do que 4 versões: A versão original, a versão internacional (não vejo muita diferença entre as duas), a versão do diretor e a versão Final.




          Sentei o DVD no meu PC e fui assistir.


          Não tem comparação.



         A "metida de dedo" dos donos da produtora na versão original fez toda a diferença. E na boa, a verdade é que esse filme foi uma cagada atrás da outra. O roteiro era completamente diferente (nem o nome era esse), troca roteirista, diretor não sabe o que quer da vida, pós produção desnecessariamente longa com montagens e montagens entre o diretor e o editor tentando definir o filme (por isso que tem a versão do diretor e a final. Essas devem ser apenas algumas das versões que eles criaram)... Meterem a mão para fazer o filme ser lançado foi a melhor coisa que poderia ter acontecido ao filme que dezenas de vezes esteve ameaçado de nunca ser concluído por diferentes problemas. Está tudo nos extras do box, mas não é bem sobre os erros que eu vim falar, mas sobre os acertos.





           Ridley Scott (Gladiador, Falcão Negro em Perigo, A Lenda, Chuva negra, Alien, etc...) sempre me pareceu ter uma certa dificuldade com a narrativa. Em "contar a estoria" para o espectador, faze-lo entender o que se passa no contexto geral da estoria que estamos assistindo. Porém, ele que começou como diretor de arte, sabe dominar a mise-en-scène de forma espetacular e até única. Vejo em Blade Runner essa sua habilidade em sua melhor forma. O design, os materiais, o uso de câmera, lentes, criam uma ambientação realmente fantástica dando a cada cena algo de "memorável". É difícil você confundir alguma cena de Blade Runner com outro filme de tão únicas que elas soam aos olhos. Ângulos e cores, associados a cenografia,  fazem de cada tomada um deleite para os olhos dos amantes da sétima arte.


          Syd Mead foi o principal ilustrador da arte conceitual de Blade Runner. Se inspirando nas artes de ilustradores de revistas como Heavy Metal, criou no papel a maior parte do que vemos em cena. Imaginando desde objeto até a cenários, o que o fez cair nas graças de Scott e juntos bolaram alguns dos principais conceitos sobre futuros sombrios cyberpunk cinematográficos utilizados como referencia até hoje. Ainda se usa a expressão "tipo Blade Runner" para exemplificar algo tamanha é sua influencia.



Não me pergunte o que é aquilo no fundo do copo. Prefiro não saber...

           A cenografia e figurinos são na maior parte do tempo incríveis, porém em outras meio apagadas. Mas acho que a ideia de Scott era mesmo essa. Criar diferentes ambientes no futuro confuso de BR, onde uma hora você está em um grande apartamento intimista e em outra numa feira no Marrocos. Ou num prédio antigo, sujo e mal conservado.




          Os efeitos especiais são muito interessantes em sua técnica e que, em sua maior parte, funcionam bem até hoje (exceto a cena da replicante morrendo na rua. Essa não funcionaria nem no cinema mudo) criando um estilo visual próprio.








          As atuações são na maioria aceitáveis. Não gosto muito de Harison Ford em papeis mais sérios e não acho que ele tenha sido uma boa escolha para interpretar Rick Deckard, o caçador de androides. Está bem sofrível na narrativa do filme, mas como isso foi uma das coisas que entraram meses depois da pós produção e ele já estava de saco cheio daquele projeto, isso também deve ter pesado na hora de interpretar. Sean Young (Rachael) também deixa a desejar ao meu ver. Não há nenhum momento de grande atuação da parte dela; o mesmo para Daryl Hannah (Pris). Mas quem eu acho que trouxe vida ao personagem e até ao filme foi Rutger Hauer (Roy Batty). Dando uma interpretação ao seu personagem que brinca entre um frio homicida, uma indefesa criança e um romântico amante sem soar exagerado ou incoerente. Além disso, a cena de "lagrimas na chuva" é uma invenção dele. Ele criou aquela fala numa das sessões de leitura do roteiro. Que para mim é a cena que vale o ingresso.




          Blade Runner é uma ficção cientifica, mas é também um filme noir, um bom filme noir. Tem todos os elementos que compõem um filme do estilo: Uma estória aparentemente simples mas com desdobramentos, personagens principais de natureza conflitante, uma "femme fatale" (na verdade, mais de uma), uma narrativa sombria. Narrativa alias que não está nas versões posteriores, mas que é algo que traz uma nova dimensão ao filme, e por vezes até amplia o mundo de Blade Runner ou seu personagem principal. Infelizmente em outros momentos acho que deixa a desejar. Se tornam falas de linha muito insossa. Parecem escritas por redator de obituário. O roteiro ( da versão que foi aos cinemas) é algo lindo de se analisar. Como sempre digo, as melhores ficções cientificas são pretextos para falar de alguma particularidade da condição humana. E em BR nós falamos sobre a existência do homem como individuo: Ela acaba.


          A vida acaba. 


          A todo momento o roteiro nos fala disso.



          Quem nós somos?

          O que nos define?



          Mas principalmente: Quando o que nós somos irá findar e como podemos evitar isso?


          Se analisarmos a estória, veremos que os replicantes (androides) nada mais são do que a personificação de nós mesmos, de uma maneira mais crua e objetiva. "Mais humanos que humanos". E a mensagem que ele deixa, pelo menos para mim é que não podemos nos agarrar a isso. Não podemos deixar que a ideia de que nossas baterias um dia irão acabar se torne uma obsessão. Se não passaremos a vida preocupados com o dia que era acabará e ela então acaba, e nós a desperdiçamos tentando impedir ou adiar o inevitável.


Filme sempre recomendado aqui no blog.


(Sobre a trilha sonora eu já comentei nesse post:)

































































As vezes tenho a impressão que já vi algumas fontes e logo em outro lugar...




























Eu não sei se é mais engraçado, hipnótico ou perturbador...









"All those moments will be lost in time... like tears in rain.
Time to die."












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